14,50 - sem troco

Ela caminhava para casa, os passos apressados, sentindo em seu peito uma inquietação, a angustia de estar perdendo algo... mas o que seria? Em suas lembranças os olhos do rapaz, a boca e a mania que ele tinha de sorrir sem motivos... e de ficar olhando para ela vez após vez, talvez fosse isso... talvez ela estivesse perdendo as lembranças.
Do outro lado da cidade, ele rabiscava uma carta, para alguém que já foi a muito tempo a caneta parecia feita de chumbo e cada palavra escrita era tão densa e pesada como uma bigorna, ele sofria por escrever aquilo, era fato deixar alguém não era algo bom, mas nessa situação parecia ser o melhor a ser feito, a garçonete traz seu café e percebe a mão tremula do jovem rapaz.
- Muito nervoso? – Diz ela.
- Como se hoje fosse o dia da minha morte. – respondeu o jovem.
- Engraçado, meu avô sempre me disse que na hora da morte a gente fica calmo... tem certeza que esta nervoso?
-Eu estou sim, é que hoje morre uma coisa que eu não gostaria que morresse nunca...
-Mas o que seria?
-Hoje morre minha fé no amor, nas pessoas e na certeza de que algo pode ser bom... mas me enganei...
-Desapontado?
-Desiludido na verdade.
Dito isso a garçonete o olha nos olhos e diz
-Desilusão é a destruição de um mundo pessoal, você se iludiu não tem por que ficar assim a culpa é sua. Levante a cabeça e siga em frente.
-De certa forma a culpa é minha sim, mas a ilusão foi outra.
A menina chega a frente de sua casa o prédio com corredores largos, e colunas no térreo parece mais vazio do que nunca, a casa fria os olhos dos vizinho e ela calada entra no elevador, o medo de que ao chegar em casa esteja exatamente como ela deixou... sem cor sem sabor... sem por que.
A porta, a chave e finalmente a sala, o tapete e a parede, a certeza de que tudo esta como ela queria, mas ao mesmo tempo não esta... ela sente que esqueceu algo... e descobre..
O telefone toca, o rapaz atende sem entender bem e do outro lado.
- Oi... saudade de você, tudo bem?
-Sim tudo bem, o que quer?
-Queria falar com você sei La, amenidades.
-Não sei se é uma boa, hoje eu não to bem e acho que é melhor a gente não se falar mais.
-... Ela conquistou mesmo você não é?
-... não... ninguém me conquista mais.
-Como assim?
-Meu tempo de acreditar acabou... virei gelo, na água quente eu sumo me misturo não mudo a mim de forma alguma, não viro café, nem um ovo duro ou cenoura mole... eu apenas me misturo e desapareço.
-Eu acho que vou sentir falta...
-Não ache... tenha certeza e quando tiver certeza tente fazer algo diferente.
-... Você esta chateado comigo... tem motivos... mas..
-Não tem mais... fica bem – Disse ele secamente desligando o telefone.

A garçonete olha para ele novamente e diz.
-Foi melhor que escrever?
-Não... foi pior... me iludi de que tudo que disse é verdade, um dia eu vou descobrir que não é...
- Pois é, isso é amar, quando se esta apaixonado como você esta a gente nem percebe as ilusões que criamos, mesmo que seja apenas para esquecer a paixão... mas ela volta a tona... como toda verdade.

A conta deu 14,50 e ele pagou com 20...

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