Folheando memórias.

Sentado em seu canto, o jovem rapaz folheava as suas lembranças como quem folheia uma revista, algumas imagens o faz parar mais tempo enquanto outras ele passa sem se atentar as legendas ou textos.
Durante a tarde toda ele andou de um lado para o outro tentando lembrar-se da mais antiga lembrança de sua mãe, a que ele mais gostava, e agora no fim do dia ele finalmente lembrou-se, não eram as lembranças de uma tarde no parque ou um passeio. Foi apenas uma tarde com ela depois de um dia ruim na escola e uma lição de moral...
Sorriu ao lembrar ela dizer sentada a seu lado “Filho, quando a gente desiste de algo que a gente gosta ou que sabe que precisa a gente acaba desistindo de nossa vontade” o tempo todo ele pensou nisso, viveu com essa frase na mente, e os valores presos a ela.
Hoje, anos a frente enquanto folheava as lembranças deparou-se novamente com a memória presa a outra mulher, aquela mulher que ele viu subir as escadas e que desde então nunca mais deixou de fazer parte das paginas de sua vida... ao menos nas lembranças, mesmo que a cada novo volume de lembranças ele colocasse sempre as mesmas fotos era ela, era sempre ela.
Ele lembrava-se de ver os cabelos com cachos suaves, lembrava-se dos olhos vivos e fortes, e lembrava-se principalmente do perfume dela, mas agora ali, folheando as lembranças lembrou-se do ultimo dia em que a viu, da ultima vez que puderam se encontrar e se olhar nos olhos, lembrou-se dela se despedindo dele, dando um beijo suave na ponta de seus dedos e colocando os mesmos no peito dele, lembrou-se dos passos que deu se afastando, do peso que sentiu, e de uma senhora perguntando se ele estava bem... lembrou-se que chorava por não ter força de olhar para trás... e lembrou-se que nunca mais pode olhar nos olhos dela sabendo que ela olhava nos olhos dele.
A cada pagina que virava, ele a via a lia e entendia que tinha feito o oposto que sua mãe dissera anos antes... ele tinha desistido de uma vontade, de algo que gostava, de algo que precisava... ele tinha desistido dela.
Olhou a sua volta, e ali sozinho, proscrito e tendo como companhia apenas as lembranças em sua cabeça e os travesseiros a suas costas, um lençol embolado em seus pés e a luz quente de um abajur, olhou novamente para a imagem dela e teve medo de nunca mais conseguir esquecer aqueles olhos e aquele dia em que ela subiu as escadas e iluminou o andar como o sol faz ao surgir de um novo dia...
Ele não tinha mais vergonha em assumir a quem quer que fosse, que ele a amava... mas sabia que para ela isso não fazia diferença... ele sabia que para ela era diferente...
E assim ficou ali... folheando as suas memórias com ela .

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